sexta-feira, 24 de outubro de 2014


Depois, aquilo tudo. Fui atrás de Ana e marquei um novo encontro. Ana aceitou o encontro, mas não o beijo. Dissimilou, simulou concorrências. Desisti, ela me telefonou. Nos beijamos, fomos ao cinema, tentamos fazer sexo, mas minha gravata ficou com um nó preso na minha boca, e o clima se foi. Aí, transamos. Eu andei sumido, por sete dias consecutivos. Ela jurou não ficar mais comigo. Depois, se rendeu. Nossas mãos suaram, o medo fugiu. Elegemos “Wonderful Tonight” como canção perfeita para nós dois. Ouvimos 392 vezes a mesma canção. Critiquei o fato de ela dormir de edredom e ventilador. Sorrimos na fila do supermercado, compramos camisinha, ela conheceu minha mãe. Tomamos banho juntos. Ela ficou pra jantar. Ficou pro café-da-manhã. Disse que ficaria para todo o sempre. Me contou sonhos sem nexo. Me fez decorar a fórmula de Bhaskara. Sentiu-se envergonhada quando sentiu porra escorrendo pela primeira vez entre os tornozelos, acoada sobre a cama. Disse coisas baixinho. Me entregou cartas amorosas, falou de mim com amigas, encheu o saco das tais amigas. Pediu coisas com voz de criança, música no violão em madrugadas de brisa. Foi pervertida, foi perseverante, foi perversa. Me deixou com cara de bobo. Discutiu a relação na porta da locadora de filme. Me levou até o interior para o casamento de uma prima. Correu ao me lado em volta da lagoa. Me apresentou com beijos molhados - na escola de culinária tailandesa, na formatura de um colega de laboratório, numa roda-gigante, na fila do banco, numa missa de sétimo dia, no Burguer King. Nadou numa piscina de bolinhas. Andou dispersa. Sentiu ciúmes. Gritou comigo. Teve medo da chuva, de sapos, do fim. Conheceu novos tipos de abraço. Foi em mais shows de rock, estádios de futebol e peças de teatro ao ar livre. Brigou comigo, me mandou embora, sentiu o peito queimar. Me ligou dezessete minutos depois. Abriu a porta e me deixou entrar outra vez. Abriu um sorriso por conta de outro sorriso. Comeu brigadeiro de panela, foi obrigada a usar chinelo, tomar vacina, comer peixe, tomar porre, fazer exame de HIV. Sentiu nojo quando beijada no nariz. Foi obrigada a ler On The Road e não chegou à terceira página. Leu conto do Bukowski, odiou, e disse que o velho safado não passava de um porco. Me ensinou a fazer feijão à mineira. Aprendeu a calibrar pneus. Foi caçoada pela calcinha com elástico frouxo. Fez amor. Perdeu um orgasmo. Fez sexo achou três. Dormiu no sofá. Me chamou de grosso e estúpido. Comemorou um ano e meio. Ganhou brincos prateados. Me espremeu alguns cravos, me cravou dentes, plantou cravinas na varanda. Tivemos aquela discussão sobre impossibilidades de adaptar o roteiro de P.S Eu Te Amo para a vida real. Pegou meias emprestadas. Pôs colchão no chão da sala. Fingiu não chorar quando a personagem Mandy Moore morre. Comprou teste de gravidez pela primeira vez e o balconista sorriu nervoso. Senti ausência e não terminou. Ganhou colo quando perdeu um parente. Foi teimosa. Foi chata. Foi burra. Fez piadas. Fez cena. Fez pum. Perdoo, enjoou, entendiou, debochou, doou. Reclamou do calor, do tênis no meio do corredor, porque não ganhou beijo de chegada. Perdeu medo de montanha russa. Perdeu o medo de lesma. Cresceu profissionalmente. Construiu um álbum de fotos, organizado, contando uma história. Me inspirou em canções. Conheceu uma pessoa. Foi embora.

Gabito Nunes.





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