terça-feira, 29 de setembro de 2015





“Me faltava inspiração pra escrever, me faltava sono pra dormir, me faltava fome pra comer, me faltava vontade pra fazer qualquer coisa. Eu nunca fui completo ou pleno na minha vida, a propósito, eu nunca fui completo ou pleno em nada, absolutamente nada, sempre me faltava alguma coisa, nem ao menos que fosse o açúcar para adoçar o café. Me faltava vontade de abrir os olhos, levantar da cama e sair de casa, e se eu pudesse, eu lhe juro que passaria o resto dos meus dias ali, naquela cama velha com lençóis sujos e fronhas amassadas. Eu sempre fui oco, meu quarto refletia melhor do que qualquer outra coisa o que eu era por dentro: uma coisa oca com algumas outras coisas quebradas, encangalhadas ou sujas espalhadas pelos cantos, um silêncio apavorante e um ar de “ninguém-cuida-desse-lugar-há-um-bom-tempo”. Eu não sentia mais nada, nadinha, eu passava os meus dias como todas as outras almas miseráveis do planeta: apenas sobrevivendo. Porque viver de fato, viver no duro e forte da palavra, meu amigo, não é isso, é qualquer outra coisa, menos isso. Aquilo no que eu me encontrava naquele momento, eram as ruínas, ou melhor dizendo, era fim. Aquilo era a destruição, o opaco, a falta de vida nas coisas, nas plantas, nas almas, nas cores - porque de certa forma, tudo era cinza -, nas pessoas, aquilo era a falta de vida na vida. Eu vivia em meio a algo distante. Eu não sentia tristeza, aliás, eu não sentia mais nada, porque sentir qualquer sentimento já seria sentir, e eu me negava a sentir qualquer coisa, por melhor ou pior que ela fosse. Eu me negava a sentir dor, tristeza, pena, amor, felicidade ou qualquer outra denominação que eles davam há coisas que duravam umas 4 horas e depois passam, como tudo na vida. Eu apenas me negava à sentir. Eu levava o “nada” a sério de mais, aliás, levava tão a sério, que o nada passou a ser eu.”

Chamuscar   






“Amar é querer ser amado.”

The Beatles







“Tem gente que vem e quer voltar, tem gente que vai e quer ficar.”


Maria Rita






quinta-feira, 17 de setembro de 2015






Era a vida se mostrando mais poderosa do que eu e minhas listas de certo e errado. Era a natureza me provando ser mais óbvia do que todas as minhas crenças. Eu não mandava no que sentia por você, eu não aceitava, não queria e, ainda assim, era inundada diariamente por uma vida trezentas vezes maior que a minha. Eu te amava por causa da vida e não por minha causa. E isso era lindo. 

 Tati Bernardi. 









A tristeza permitida. Se eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como tomar banho, colocar uma roupa, ir pro computador, sair pra compras e reuniões – se eu disser que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem pra sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar e tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como? Você vai dizer “te anima” e me recomendar um antidepressivo, ou vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer pra eu colocar uma roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela que sempre fui, velha de guerra. Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera a tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para o seu psiquiatra. A verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste, também está tudo normal. Porque ficar triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto a alegria, é um registro de nossa sensibilidade, que ora gargalha em grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar deprimido. Depressão é coisa muito séria, contínua e complexa. Estar triste é estar atento a si próprio, é estar desapontado com alguém, com vários ou consigo mesmo, é estar um pouco cansado de certas repetições, é descobrir-se frágil num dia qualquer, sem uma razão aparente – as razões têm essa mania de serem discretas. “Eu não sei o que meu corpo abriga/ nestas noites quentes de verão/ e não me importa que mil raios partam/ qualquer sentido vago da razão/ eu ando tão down…” Lembra da música? Cazuza ainda dizia, lá no meio dos versos, que pega mal sofrer. Pois é, pega mal. Melhor sair pra balada, melhor forçar um sorriso, melhor dizer que está tudo bem, melhor desamarrar a cara. “Não quero te ver triste assim”, sussurrava Roberto Carlos em meio a outra música. Todos cantam a tristeza, mas poucos a enfrentam de fato. Os esforços não são para compreendê-la, e sim para disfarçá-la, sufocá-la, ela que, humilde, só quer usufruir do seu direito de existir, de assegurar seu espaço nesta sociedade que exalta apenas o oba-oba e a verborragia, e que desconfia de quem está calado demais. Claro que é melhor ser alegre que ser triste (agora é Vinícius), mas melhor mesmo é ninguém privar você de sentir o que for. Em tempo: na maioria das vezes, é a gente mesmo que não se permite estar alguns degraus abaixo da euforia. Tem dias que não estamos pra samba, pra rock, pra hip-hop, e nem pra isso devemos buscar pílulas mágicas para camuflar nossa introspecção, nem aceitar convites para festas em que nada temos para brindar. Que nos deixem quietos, que quietude é armazenamento de força e sabedoria, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta, anunciando o fim de mais uma dor – até que venha a próxima, normais que somos.

Martha Medeiros.






Eu não sei voar, eu não sei mais nada...





domingo, 13 de setembro de 2015







“Você vai ficar porque está chovendo, ou está chovendo porque você vai ficar?”

Gabito Nunes.







“Ninguém é obrigado a nos conhecer por dentro. Além disso, tem o que a gente é, a imagem que a gente passa e o que os outros concluem dela. Não quero que soe petulante o que vou dizer, mas nem faço muita questão que as pessoas me conheçam a fundo. Tem gente que não merece o nosso coração aberto. Certas pessoas não precisam conhecer nossa alma. Porque elas nem vão saber o que fazer com tanta informação.”

Clarissa Corrêa





sexta-feira, 4 de setembro de 2015





“E eu passei os últimos anos escrevendo sobre como você era especial e como eu te amava e isso e aquilo. Mas chega disso.”

Tati Bernardi.





“Tira a maquiagem pra que eu possa ver aquilo que você se esforça pra esconder. Agora somos só nós dois, já podes parar de fingir. Mas cala essa boca, e me diz com o olhar quem era você até me encontrar, se agora és diferente. O que eu fiz que te fez mudar? Eu lembro dos lábios tremendo ao dizer, eu não vivo sem você… Então diga que não vai sair da minha vida, diga que não passa de mentira quando dizem que o amor morreu. Tira essa roupa pra que eu possa ver se não há uma arma, tentando se esconder o mal vive num lar perfeito e sem infiltração. Tira o cabelo da cara e me diz, se por um segundo quiseste me ver feliz ou se és o meu destino tentando me dar outra lição. Eu lembro de serrar os punhos pra dizer eu não amo mais você… Então diga que não volta mais pra minha vida, que a nossa estrada é bipartida, esquece o dia em que me conheceu. Então diga que nem todo dinheiro dessa vida não vai comprar de volta. Acolhida no peito de quem já foi todo seu. A casa é minha, mas pode ficar. Eu volto amanhã, e não quero mais te enxergar, faça suas malas e nunca mais volte aqui. Eu juro pela vida, da mãe, do pai, ciente do peso da expressão “nunca mais”. Volte a oferecer teu corpo a quem preferir viver ao lado de quem não tem nada pra dizer. Confesse pra mim de uma vez, mas diga que nunca foi feliz nessa tua vida. Teu texto, teu sorriso de mentira, pode enganar a todos, não a mim. Então diga que essa mão que acena na partida por tantos idiotas, pretendida é a mesma que decreta o nosso fim. Assisto a teus passos, como a um balé, quem vais usurpar agora é que ninguém te quer. A verdade demora mas chega sempre sem avisar. E o grito contido no teu travesseiro ecoa nos lares do mundo inteiro, não tira esse rímel, pois hoje eu quero vê-lo borrar.”

Fresno